quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

53 - De Santa Cruz a La Paz.

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"Columbus", o nosso hotel em La Paz.



La Paz, Plaza de Armas. Na foto de cima, Igreja de Nª Sª de La Paz. Nesta, pode observar-se ao fundo, anexo à Igreja, um edifício com a bandeira hasteada onde o Presidente tem o seu gabinete de trabalho.

Pl. de Armas. Ao fundo, o edifício do Congresso.

Pl. de Armas. À esquerda, a fachada da Basílica de Nossa senhora de La Paz, padroeira do país.

O Luís junto ao Monumento da Pl. de Armas.

La Paz. Uma rua comercial do centro histórico.

Outra rua da cidade de La Paz.

La Paz. Viela da cidade velha.

O Luís com o nosso guia Martin numa rua de La Paz, que dá acesso ao Museu etnográfico.

Museu etnográfico de La Paz. Nesta fotografia, uma cholita (jovem solteira), usa o sombrerito ligeiramente inclinado sobre a testa dando assim indicação aos eventuais pretendentes de que se encontra descomprometida. Esta jovem viveria numa zona baixa dada a cor clara do vestuário que se torna mais escuro à medida que a região de origem sobe em altitude.

Museu etnográfico de La Paz. A foto representa uma chola, mulher aymara casada. Usa um sombrerito feito por medida (para que não caia), numa posição perfeitamente horizontal relativamente à testa. Note-se a característica manta tecida à mão a partir de materiais muito resistentes e indeformáveis em que entra a lã de vicunha, iaque ou lama. A mulher ata as pontas da manta sobre o peito transformando-a numa espécie de alforge no qual transporta os filhos pequenos, as compras ou os produtos que vende na praça ou na rua. As mãos devem manter-se permanentemente livres.

Traje de um varão Inca.
La Paz. Pormenor da Casa-Museu do patriota Pedro Murillo.

La Paz. O centro e os altos.

La Paz. Miradouro de Kelly.

La Paz. Vista panorâmica a partir do miradouro de Kelly.

La Paz. Nesta foto pode observar-se o espinhaço montanhoso da cordilheira andina rodeando a cidade. Ao fundo avista-se uma das antenas que nos serviu como ponto de referência durante a escalada até ao miradouro do sagrado Coração.
La Paz, outra vista a partir do miradouro de Kelly.
La Paz, uma vista da cidade com um grande plano do seu Estádio.

O tempo começava a escassear. Os dias de folga em São Paulo e Bataguassu iriam custar-nos a reformulação do plano de viagem de modo a chegarmos a Cusco até à data limite de 8 de Dezembro, devendo contar já, nessa data, com os indispensáveis 3 ou 4 dias de aclimatação à altitude. Iríamos por isso curto-circuitar o trajecto deixando para segundas núpcias preciosidades como Cochabamba, a capital do chaco, Sucre e Potosi. Tomada a decisão, voamos com a Aero-Sur de Santa Cruz para La Paz, a capital boliviana, onde chegámos pelas 14 horas de 4 de Dezembro. Foi um voo tranquilo, feito sob condições atmosféricas excepcionalmente favoráveis o que nos permitiu visualizar toda feérica beleza da cordilheira andina com picos cobertos por neves eternas, gargantas profundas cavadas entre escarpas nuas e lá no fundo, pequenos vales de um verde luxuriante acompanhando o curso de rios ou bordejando pequenos lagos alimentados pelas águas do degêlo. Na quase monocromática paisagem, predomina o tom ocre matizado pelo branco resplandecente dos glaciares. Numa cortesia do comandante e sua tripulação, fizemos um sobrevoo em círculo sobre a cidade com uma fantástica aproximação ao Illimani, um cume nevado com mais de cinco mil metros de altitude que parecia estar ali á mão. Este pico domina a região de La Paz e o seu nome significa numa língua local águia dourada porque, explicaram-nos, quando tingido pelos raios do sol poente, o seu contorno sugere uma refulgente águia preparando-se para levantar voo. O desembarque fez-se sem sobressalto, mas mal havíamos percorrido as primeiras dezenas de metros do túnel que nos conduzia à área de recuperação de bagagens e já estávamos sem fôlego! Bem nos tínham avisado de que devíamos tomar uma infusão à base de folha de coca a que os locais chamam soroche. Segundo eles, ajuda a combater o mal da altitude que aqui se cifra pelos quatro mil metros. Não estávamos sós nesta incapacitante miséria, outros em condição idêntica, pura e simplesmente detinham-se a cada passada, davam pequenas palmadas sobre o tórax ou abanicavam a mão em leque à frente do nariz. Para maior desconforto, estando nós vestidos com T shirt e calções, um aguaceiro gélido abateu-se sobre a área do aeroporto no momento em que procurávamos transporte para o centro da cidade situado à distância de uma meia hora de carro. Claro que havia táxis disponíveis cujos condutores disputavam a atenção dos eventuais clientes, mas por norma adoptámos o transporte público como meio para os transfer.
Pela módica importância de cinquenta cêntimos de euro cada, tomámos assento numa viatura a que os brasileiros chamavam pirua (já não existem) e assim chegámos ao centro, tendo apeado frente à Igreja de S. Francisco. Uma curta mas esfalfante caminhada a pé - era a subir e de mochila às costas! -, conduziu-nos até à Praça do Estádio em cuja proximiade encontrámos alojamento, tendo ficado instalados no hotel Columbus, situado na rua Illiani a poucos metros da referida praça.
Vista de cima, La Paz é uma cidade no mínimo estranha! Imagine-se a cratera de um extinto vulcão ou um enorme lago que em dado momento evaporou, deixando em seu lugar uma gigantesca depressão no solo com mais de quatrocentos metros de profundidade situada a três mil e seiscentos metros de altitude. No fundo deste buraco imaginário temos o núcleo histórico da cidade rodeado por menos de meia centena de prédios modernos de maior volumetria. É a zona mais quente e húmida, onde se situam os edifícios do governo, blocos de apartamentos, comércio formal e sedes das multinacionais. Temos depois, localizados a meia encosta, os bairros nobres, constituídos por vivendas de excelente qualidade, mais ou menos ajardinadas, pertença de gente com evidentes sinais exteriores de riqueza. Segue-se uma espécie de anel viário que faz a transição com os Altos, nome dado aos bairros populares que trepam encosta acima até ao planalto situado a mais de quatro mil metros. São centenas de milhar de habitações, algumas bastante precárias, outras abrigando famílias de classe média ou média-alta, tendo em comum o facto de nenhuma se encontrar rebocada ou pintada! Motivo: Logo que a obra fica concluída, o município lança sobre o imóvel um imposto que muitos munícipes consideram incomportável. Como medida defensiva e talvez como forma de protesto, ninguém conclui a construção. O visitante não avisado, ficará perplexo ao contemplar de um dos vários miradouros da cidade este oceano de paredes e telhados de cor única, a do barro cozido.
Verdadeiro formigueiro humano, o alto tem as suas avenidas, ruas e vielas, possui hospital e centro de saúde, abastecimento de água, saneamento e luz eléctrica. Nas suas artérias mais largas realizam-se feiras e mercadinhos semanais, mas há também comércio formal, correios e ciber-cafés. Os transportes são quase monopólio de candongueiros que apregoam os vários destinos a partir de carrinhas tipo furgão que circulam de porta aberta, onde é possível meter 14 passageiros numa viatura de 8 lugares e condutor! Também circulam pequenos autocarros municipais de tromba avançada, bastante antigos, pintados com cores garridas.
Mais acima, a uma ou duas centenas de metros da margem da depressão, ficam as habitações mais humildes. Aqui não há nada, nem mesmo ruas ou caminhos, apenas carreritos onde os pés resvalam no pavimento saibroso escalavrado pela chuva. Os telhados são de chapa de zinco ou materiais recuperados a partir de qualquer escombreira. O cheiro nauseabundo denuncia a ausência de rede de esgotos ou simples latrinas. Os seus habitantes são mais esquivos evitando o contacto com estranhos. A ligá-los ao planalto, existem a certos intervalos alguns lanços de escadaria em cimento. Cada um destes degraus não terá mais do que 20 centímetros de altura e representa para pessoas não habituadas à altitude obstáculos de difícil transposição, exigindo um esforço comparável ao do alpinista quando escala os picos mais altos do planeta. Para que tenham uma ideia da dificuldade, dir-vos-ei que no dia 6 de Dezembro, dia de eleições em que o país literalmente parou como é tradição para que os cidadãos possam votar em segurança, eu e o Luís decidimos subir a um destes altos. Do ponto onde iniciámos a escalada à cota de 3600 mts até ao miradouro do Sagrado Coração situado nos 4060 mts, a distância rondará os 2Km. Necessitámos de quatro horas e meia para o percorrer e só não houve desistências porque atingido um ponto de não retorno, onde nem o socorro seria possível, houve que apelar até ao limite das nossas forças e continuar, um degrau a cada cinco minutos, e assim atingimos o planalto. Experiência a não repetir! Para nossa surpresa, além das torres de telecomunicações que nos tinham servido como pontos de referência durante a escalada, deparámo-nos com uma importante área comercial e residencial, restaurantes, hotéis e uma portagem de auto-estrada, aquela que liga o aeroporto ao centro da cidade. Como só os veículos prioritários, os da imprensa e dos observadores internacionais estavam autorizados a circular, tínhamos pela frente o problema do regresso, que a ser feito a pé e desta feita por estrada (30Km), conduziria à hecatombe! Dirigi-me aos agentes da polícia de trânsito que na área da portagem controlavam os raros veículos que passavam com grandes dísticos afixados nos para-brisas, expliquei-lhes a nossa delicada situação e obtive autorização para pedir boleia no único carril (passagem) em serviço. Em menos de dois minutos estávamos a bordo de uma pick-up do jornal La Prensa que se dirigia em serviço de reportagem a uma mesa de voto situada a menos de cinquenta metros do hotel Columbus. Foi a confirmação do lema “a sorte protege os audazes”, perdoem-me a imodéstia.
Seriam umas cinco e meia da tarde, estávamos em casa e havia apenas uma última questão por resolver, a do onde jantar, já que tínhamos sido avisados que todos os estabelecimentos da cidade capazes de nos prestar esse serviço estariam encerrados, incluindo o restaurante do hotel. Nessa manhã, tinha reparado nos vendedores ambulantes de comida instalados junto à rotunda da Praça do Estádio onde desembocava a rua do nosso hotel. Com os seus fumarentos e olorosos grelhadores a carvão a atraírem a clientela, para lá nos dirigimos e debaixo de um pequeno toldo de plástico que uma rabanada de vento não tardou em mandar pelos ares, tomámos um opíparo lanche ajantarado constituído por uma sandes de frango mais um chorizito grelhado entalado num papo-seco e umas goladas de coca-cola à temperatura do chá. Uma benção para quem, depois de um esforço tremendo, nada tinha ingerido desde o pequeno almoço desse dia. O resto da tarde e parte da noite, dedicámo-la ao tema das eleições que seguimos pela TV, tendo-se confirmado bem cedo mais uma folgada vitória do presidente Evo Morales. rwesto da história virá a seguir. Até lá, queiram aceitar as minhas cordiais saudações e votos de Feliz Ano Novo.

1 comentário:

  1. La Paz e demais benesses para este teu Novo Ano, quiçá diferente, mas que não esquecerás mais.
    Magnífico!...

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