quarta-feira, 19 de agosto de 2009

7 - Viajar em tempo de crise

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Foto: stormap.sapo.pt


Notícia de hoje:

Contrariando todas as estimativas (mais uma vez), a zona OCDE saiu em bloco da recessão.

Notícias da semana:

1 - Contra as previsões e expectativas de todos analistas, França e Alemanha apresentam um crescimento do PIB de 0,3% no segundo trimestre de 2009. Conjugando este dado com outros anunciados nas semanas precedentes, pode inferir-se que estão a dizer adeus à crise e, provavelmente, a arrancar para mais um ciclo de crescimento no cenário de “um maravilhoso mundo novo”, em que a ciência será rainha e as novas tecnologias as princesas, montando potentes cavalos de energias renováveis.
Portugal, um tigre (!) da economia da Europa dos vinte e sete – porque também há a Europa do Norte, do Sul e do Leste –, não podia ficar atrás, e no mesmo período, minhas senhoras e meus senhores, segundo o INE, cresce também uns fantásticos zero, vírgula, três por cento
2 - A Tap air Portugal está este verão a recuperar dos quase quatrocentos milhões de euros de prejuízos do ano passado, palavra de Fernando Pinto.
3 - O fiscalista Medina Carreira, que dispensa apresentações, diz em entrevista à Sic Notícias que o País está transformado num enorme BPN.
4 - Um deputado estadual brasileiro, é acusado de mandar executar comparsas seus e mostrar o trabalhinho em directo, num programa de TV de que era apresentador.

Notícias de semanas e meses recentes:

Portugal tem uma economia de Casino (!), afirmam reputadas vozes dos diversos quadrantes políticos.
E dado que apresenta défices estruturais gigantescos, só lá para 2011, mais seguramente em 2012, poderá respirar de alívio ao olhar a crise pelas costas.


Concordo que pode parecer bizarro estabelecer ligação entre estas notícias. Mas vamos por partes.
Dizia George Clemenceau (1841-1927): “A guerra é uma coisa demasiado séria para ser confiada aos militares”. Parafraseando-o, eu digo que a economia é uma área demasiado séria para que possamos confiá-la aos economistas. Que fique bem claro que não quero nem posso entrar em generalizações numa matéria de que percebo nickles e, nem por um momento, me passa pela cabeça por em causa a honorabilidade da classe, não desconhecendo que em todas elas há maçãs bichosas.
Como é sabido, a economia está longe de ser uma ciência exacta. Pese embora o facto de se servir de uma ferramenta que lhe confere alguma, direi mesmo, muita, fiabilidade – a matemática –, lidar com a volatilidade de variáveis como “estados de alma” ou níveis de confiança deve ser fogo! Sou o primeiro a compreender que não será nada fácil criar algoritmos previsionais, sobretudo a partir do momento em que os meios de CS passaram a cavalgar a onda do pessimismo, para não dizer do desespero. Não é novidade para ninguém que as boas notícias não fazem notícia. O “share”, a luta desesperada pela conquista de audiências, porque disso depende a sobrevivência do grupo e o salário ao fim do mês, levaram quantas vezes, à astuciosa manipulação de dados fornecidos pelos experts, já de si sombrios qb. Mas ser sombrio não basta. É necessário adjectivar, ler com determinada entoação, arquear as sobrancelhas, franzir a testa, abanar o queixo enfim, torná-los terríficos aos olhos e ouvidos dos telespectadores. Por outras vias, radiouvintes e leitores também apanham pela medida grossa. Porque só é verdadeiramente notícia o que é escandaloso, chocante, trágico, medonho, assustador, tenebroso, catastrófico, dantesco! E que melhor material do que este, o da “maior recessão de sempre”, com previsões qual delas a pior, lidas em tom dramático e sisudo com tiques de orgasmo iminente?
Mas voltemos aos nossos economistas …
Nos anos oitenta e noventa, ainda os alunos de economia e gestão marravam o sebentórium, ressacando de memoriais latadas, queimas e semanas académicas e já os melhorzinhos eram abarbatados pelas empresas de maior gabarito, como as financeiras e de leasing, bancos, seguradoras, multinacionais, transnacionais, brokers etc., tal era a carestia destes profissionais. Um pouco mais tarde, já as vagas não chegavam para as encomendas, o que levou uns tantos a empreenderem a fuga para a frente. Mandaram-se para Oxford e Cambridge, passaram pelo MIT, Harvard, Yale e várias outras catedrais do saber, onde realizaram trabalhos de post graduação, mestrado e doutoramento. Os mais sortudos por lá ficaram e fizeram nome, carreira e fortuna ao serviço das melhores congéneres da Europa e dos States. Em tempo de vacas gordas, houve quem recebesse “prémios de gestão” obscenos em cima de salários magestáticos. Apreciadores de marcas como patek philippe ou hugo boss, gozavam férias em hotéis de sete estrelas e pilotavam desportivos de alta gama. Nem todos nasceram em berço de ouro, mas a incondicional vassalagem prestada ao “vil metal” pela geração yuppie, teve as suas consequências. Fiel ao lema “aos trinta, estás rico ou esquizofrénico”, esta geração veio também dar notável contributo para a popularidade do prozac.
E o que é que estas cabecinhas pensadoras fizeram? A nível interno, nada de relevante até porque, se a perna é curta, o coice não pode ser grande. Mas lá fora, Senhor, o que é que eles não fizeram? Para não me esticar demasiado, direi apenas que fizeram merda e da grossa. O pontapé de partida terá sido dado há uns anos por um alto funcionário a trabalhar numa filial do extremo oriente de um grande banco francês. Em poucos meses, aquele brilhante executivo pôs o banco de pantanas, muito próximo da falência. Quando alguém se apercebeu que havia gato com rabo de fora, o puto montou-se na sua elevadíssima noção da responsabilidade e deu ao slaide. De então para cá, tem sido do melhor! Eles inventaram as engenharias financeiras mais estrambólicas, os “produtos estruturados” pouco saudáveis, tóxicos e letais, serviram Donas Brancas aos balcões de casas respeitáveis, abriram caminho a fluxos financeiros com altíssimo défice de higiene através de paraísos fiscais. Fico até na dúvida se a ideia da bolha e o ká-te-kéro não terá partido de uma destas mentes prodigiosas.
Aquilo de que não restam dúvidas a ninguém, é que chegados ao final das férias do ano passado constatámos que o país estava como o resto do Mundo, atascado até ao pescoço. Atascado em dúvidas, temor, pessimismo. Quem não se inquietou acerca da segurança no emprego, das prestações da casa, da mensalidade do jardim de infância ou das propinas dos filhos. Haveria o que comer amanhã? Funcionariam as instituições do estado, como escolas e hospitais? A fome e a miséria acarretariam níveis insuportáveis de insegurança? A tudo isto respondiam os nossos especialistas com análises e previsões, as mais negras que se possa imaginar. As aves agoirentas profetizaram anos de escuridão para a nossa economia. E quando o mundo inteiro já estivesse a festejar uma nova primavera económica, nós, porque abertos, estruturalmente mais fracos, blá, blá, blá, ainda teríamos que passar pelas penas do purgatório. Talvez lá para 20012 …13 …14!!! Quantos casamentos adiados, quantas casas, mobílias, electrodomésticos e carros ficaram por comprar, quantas obras paradas, quantos negócios cancelados graças a esta lenga-lenga da treta? Quem foram afinal os ajudantes de coveiro da nossa economia? Que credibilidade merecem estes senhores, a quem servem e que tipo de marosca os anima?
Neste Agosto pouco soalheiro, as nossas praias estão apinhadas, as estradas e auto-estradas sofrem engarrafamentos diários, nos estacionamentos dos cafés e restaurantes não há mais lugar. Os aviões da Tap voam para destinos exóticos com a lotação esgotada. Hoteleiros e agências de viagens estão caladitos, o que até nem é mau sinal, apesar de se saber que em Portugal quem não berra não mama. Os homens da distribuição (Sonae, Jerónimo Martins), vêm os seus negócios crescer e a cotação dos respectivos papéis é o dobro de há um ano.
Os portugueses têm e sempre tiveram recursos que as estatísticas e o senhor ministro das finanças desconhecem, graças a Deus!
Pelo meu lado, bem ao contrário do apregoado ano horribilis tem sido um ano fantásticus! Depois dos mini crash's de 10, 24 e 27 de Outubro, deprezando as ponderosas análises mais ou menos catastrofistas que vaticinavam o fim do mundo e o colapso da BVL, meti tudo. Até fui à cave, como no jogo do póquer. E querem saber? Trintinha por cento já cá moram! A ser bicho, prefiro morrer de estocada como o touro a desempenhar o papel de urso de circo. Boa noite e procurem ser felizes.

Juan

3 comentários:

  1. Sabes que mais, JUAN? Não tens apetência para a Política e isso é bom; mas descansa que eles (políticos) não te iriam querer ... nem de longe.
    Tocar nas feridas, soprar para o vento, ter dó, dizer-lhes que sabes (sabemos) já os incomoda.
    A pena que tenho é que a impunidade e incompetência consciente, seja mais um motivo para arrebanhar mais daqueles que não são capazes de fazer valer algo chamado COMPETÊNCIA, tão só porque lhes falta tal. Assim, os Empresários os não querem nem procuram.
    A comodidade dum emprego bem remunerado (político), sem responsabilidades efectivas, reformas ao fim de 10 anos, acumulações das ditas, a cobrança dos favores saídos dos lugares ocupados, etc. serão sempre bem mais aliciantes que .. ter de trabalhar.
    Realmente, Portugal tem mais semelhanças com o BPN, do que diferenças.
    Santos Oliveira

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  2. Apesar das estatísticas mostrarem o contrário, sim as famosas estatísticas que depois se exibem com orgulho por toda a Europa,Portugal tornou-se um país de iletrados não porque não sabem ler, mas porque não "dá jeito" a este governo ter uma população informada, formada, inteligente que saiba reflectir ou pôr em causa esta ou aquela decisão!É de bom tom oferecer diplomas de mão beijada, sem grande esforço porque como é sabido estudar pode provocar problemas psicológicos graves então a solucão é recorrer a centros de novas oportuniddades onde 5 meses equivalem a 2 ou 3 anos!!! Depois não digam que os professores não são uns heróis... leccionar a matéria de 3 anos em 5 meses é obra!! Ou será que não??? De certeza que quem escreveu estes artigos não é oriundo desta nova geração para a qual está tudo bem desde que não se canse muito e consiga obter diplomas, emprego... com facilidade porque senão faz logo uma depressão, um esgotamento, um buraco no defice da segurança social com consultas em psciólogos, psiquiatras e outras psi- especialidades! Cuidado porque mais cedo ou mais tarde, algum membro do governo vai aceder a este blog e zás... censura para cima... Mas até lá, força para manter este blog bem vivo, bem formado ao contrário infelizmente do país em que se está a tornar o nosso jardim à beira mar plantado mas onde alguém , se esquece de regar ... de cultivar todas as rosas que nele nascem!

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  3. Falando de crise em Portugal
    Um destes dias, à noite, fui à Marginal de Matosinhos ver um espectáculo que era de borla e prometia alguma qualidade, o Amália Hoje.
    Fui de carro, também tenho uma costela burguesa, e percorri a Avenida marginal sul do Porto de Leixões e a Rua Heróis de França, mais conhecida pela rua da Lota, onde se situam as catedrais do peixe, já que o marisco parece já não ser in.
    Comecei a estranhar, lugar para estacionar, nem um. Reparei melhor nos restaurantes da dita rua da Lota e estavam apinhados, incluíndo as esplanadas exteriores instaladas pela Câmara.
    Podem julgar que estou a falar de uma sexta-feira ou sábado, mas não, era meio de semana, mais propriamente uma quarta-feira.
    Para quem não conhece a zona, os restaurantes são seguidos, aos montes. Todas as antigas tascas são hoje requintados restaurantes. Se cada comensal gastar pelo baratinho 35/40 euros, os donos daqueles restaurantes não conhecem a crise, e os frequentadores também não.
    Ah, fui arrumar o carro num parque de estacionamento pago, bem distante do espectáculo que nem por isso me agradou.
    Carlos Vinhal
    Leça da Palmeira

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